Brincadeira boa não precisa de brinquedo novo


No último dia 24 de setembro, a Casa da Esquina organizou um mercado solidário no Jardim Botânico de Coimbra, voltado especificamente para crianças. Foi um processo muito rico, com cerca de 100 crianças (no decorrer de duas horas aproximadamente), fora os pais e irmãos/irmãs mais velhos(as) que foram, com os pequenos, visitar a feira.

Há todo um projeto pedagógico por trás da iniciativa e este é o aspecto mais relevante do mercado solidário para crianças. Entre os objetivos principais está o de desprender as trocas de um modelo capitalista de atribuição de valor. Ao mesmo tempo, o mercado solidário trabalha não só o desapego das crianças em relação aos seus brinquedos, mas também a idéia de que só as coisas novas têm valor e servem para brincar.
Trata-se de um processo que não termina com a primeira feira e que é bastante simples. As crianças levam brinquedos diversos (jogos, cromos, bonecos, peluches) que já não usam para a feira e uma manta para expô-los. Depois apresentam estes brinquedos ao “ecobanco”, que faz o registro do que foi trazido por cada criança. Na primeira feira, todas recebem dez jardins para que possam iniciar as trocas. A opção de uso da moeda social (jardins) em vez da troca direta tem uma razão: ampliar a experiência e o âmbito das trocas, de modo a não inviabilizar a iniciativa pela dificuldade de encontrar brinquedos de igual valor. Assim, as crianças recebem jardins pelos brinquedos e jogos que repassam aos novos amigos e, com estes jardins, levam para casa brinquedos diferentes para suas novas brincadeiras. Ao fim de cada feira, as crianças devolvem ao “ecobanco” os jardins restantes, podendo usá-los na feira seguinte. Os dez jardins iniciais servem exatamente para criar condições para o primeiro mercado.
Importante observar que um dos objetivos da iniciativa é ampliar o ciclo de vida dos brinquedos, estimulando as crianças a criarem novas brincadeiras sem que isto signifique necessariamente a compra de novos brinquedos, que logo serão também esquecidos. Outro objetivo está diretamente relacionado ao uso de uma moeda social, não ancorada no euro e, portanto, mais ligada ao valor que as crianças lhe atribuem do que ao preço que o mercado estabelece. O uso de uma moeda social ajuda a ampliar as trocas entre as crianças e garante solução de continuidade para o projeto. Mas não só: os jardins têm a função de desprogramar a percepção de crianças e pais acerca do "valor" capitalista das coisas. Entre jardins e euros não há uma equivalência direta e este exercício de imaginar quantos jardins cada brinquedo/jogo/boneca vale, sem poder atrelá-lo ao euro (já que cada criança recebe apenas 10 jardins) ajuda a estabelecer novos critérios de valoração. Bonecas, livros e jogos valem pela potência do brincar e não pelos critérios atribuídos pelas indústrias de brinquedo e entretenimento.
A iniciativa foi retratada em vídeo promocional gravado com algumas crianças que integraram a primeira feira deste mercado solidário. O vídeo, de X minutos, explica a idéia de um modo geral e reúne depoimentos de crianças envolvidas no mercado de trocas do Botánico. No próximo dia 30, este vídeo experimental participará de um concurso. Trata-se do Movimento Milénio, uma iniciativa do jornal Expresso e do banco Millennium BCP, ambos de Portugal. Caso a entidade promotora da feira, a Casa da Esquina, ganhe o concurso, o dinheiro será revertido para ampliação das instalações da mesma e para a promoção de outras iniciativas como esta. Para votar no vídeo do mercado de trocas das crianças, não é preciso estar em Portugal. Basta acessar: http://www.movimentomilenio.com/2011/10/um-mercado-para-os-pequeninos/


“No mercado de trocas das crianças, não existe euro. Só jardins. O mercado de trocas é uma outra forma de brincar, mas também de aprender. Brinquedo bom não tem que ser novo. E para a brincadeira ser divertida, não é preciso acumular brinquedos. Trocá-los é muito melhor: você faz novos amigos e leva para casa brinquedos diferentes. E, depois, trocar tudo outra vez!”

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